Em 1987, Bispo R. R. Soares anunciava “cura gay” em classificados de jornal O Globo: “O mal é espiritual”
Um anúncio publicado no jornal O Globo, em 13 de fevereiro de 1987, escancara a face fundamentalista e homofóbica da expansão neopentecostal nos anos mais sombrios da epidemia de HIV/Aids no Brasil. Assinado por R. R. Soares, então em ascensão no cenário evangélico, o texto convocava o público para uma “corrente forte” de libertação contra a homossexualidade, definida por ele como um mal de origem espiritual. “Tenho tratado de muitas pessoas com esse distúrbio, e tenho visto inúmeros casos de cura”, diz o religioso no anúncio, veiculado com destaque nos classificados do jornal.
O conteúdo faz parte de um período marcado pelo agravamento da violência e da marginalização de pessoas LGBTQIAPN+, impulsionados pela narrativa da Aids como uma “doença gay”. Esse efeito da homofobia institucional e social ficou conhecido como a Terceira Epidemia, expressão cunhada para descrever a onda de preconceito que se alastrou junto à crise sanitária. Foi nesse cenário que igrejas neopentecostais, como a fundada por R. R. Soares, começaram a crescer, utilizando o pânico moral para consolidar poder e espaço na mídia.
A publicação de um anúncio como esse revela também a estrutura e os recursos já acumulados por Soares naquela época. Apenas sete anos após romper com Edir Macedo e iniciar carreira solo, o bispo já alugava horários diários na TV Record, publicava livros com discursos contra homossexuais e comprava espaços em jornais de grande circulação para divulgar eventos como esse do anuncio, realizado no antigo cinema Holliday, na Galeria Alaska, em Copacabana — local historicamente associado à vida noturna e à cultura LGBTQIAPN+ carioca. A estratégia era clara: ocupar territórios simbólicos da comunidade e transformar espaços de resistência em palcos de exorcismo.
