SP ignora STF e nega prisão feminina a mulheres trans
O Estado de São Paulo se nega a conceder o direito a mulheres trans que não fizeram cirurgia de redesignação sexual – que remove os órgãos genitais masculino – de optarem por prisões femininas. É o caso de Tieta. Ela começou a tomar hormônios femininos na adolescência. Chegou a entrar na fila para fazer a cirurgia no início dos anos 2000, mas não foi chamada.
Sem a cirurgia, Tieta foi alocada em uma cela com 37 homens, onde foi estuprada seguidas vezes, diz ela. Em audiência com a Defensoria Pública de São Paulo, repetiu que queria ir para uma prisão feminina. O pedido foi formalizado e Tieta foi convocada à enfermaria do Centro de Detenção Provisória de Pinheiros para “verificação” dos seus órgãos genitais. Tieta foi mandada de volta para a cela masculina.
Mulheres trans e travestis podem optar por cumprir pena em prisão feminina ou masculina. O direito foi estabelecido por decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, em 2021, no âmbito de uma ação que julgava se um preceito fundamental da constituição estava sendo violado — chamada de ADPF, que é de cumprimento obrigatório em todo o país.
O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) também determina que presas trans e travestis sejam questionadas se preferem unidade feminina. A determinação está em resolução de 2020, com diretrizes de atendimento à população LGBT na Justiça, de cumprimento obrigatório. A Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo só aceita transferir para unidades femininas as mulheres trans que fizeram cirurgia de redesignação sexual.
A cirurgia de transgenitalização não é requisito para reconhecer a condição de transexual. Nesse contexto, o simples fato de esta pessoa não ter passado pelo ato cirúrgico não é fundamento válido à negativa de transferência para unidade prisional feminina. Mas a Secretaria de Administração Penitenciária alega que na unidade feminina, uma mulher trans poderia engravidar as demais detentas.
O argumento é absurdo e transfóbico, porque trata as mulheres trans como se fossem ‘homens cisgênero heterossexuais vestidos de mulheres’, que teriam suposto ‘intuito’ de ir ao presídio feminino só para poderem assediar as mulheres cisgênero. Já o caso de estupro [de Tieta] em uma cela com 37 homens mostra como há um dano real a mulheres trans em presídios masculinos.