Nany People em entrevista à Jovem Pan

Nany People e a transfobia; ser de outra geração não justifica preconceito

Nany People (57) deu recente declarações transfóbicas durante entrevista ao Morning Show, da Jovem Pan, esta semana, causando reações de toda a comunidade na internet – contra e a favor. Uma das maiores referências trans que alcançou o sucesso nacional não poupou esforços ao criticar a linguagem neutra e a nova geração de pessoas trans. Mas por que não devemos enxergar como um ataque qualquer de uma pessoa transfóbica?

Nany People é uma mulher trans, com uma longa história na TV, rádio, palcos e cinema, sempre exercendo suas funções como mulher trans, jamais abandonando sua identidade em troca de trabalho ou reconhecimento. Ela venceu em um espaço onde nunca admitiu que seu nome morto, ou seu pronome feminino fossem alvo de chacota ou atravessamentos e sim, teve que lidar por muito tempo com o fato de não ser tão passável (se parecer tão feminina).

Então por que Nany atacou a linguagem neutra e seus pronomes, bem como disse que não entende um adolescente não passável (de vestido e barba) se compreendendo como trans querendo usar o banheiro feminino? Porque a artista guarda transfobia estrutural fundamentada em seu tempo de vida, em sua geração e sua criação. Ela resguarda as imposições feitas às pessoas trans como um escudo que protege sua existência.

Para ser trans não é preciso tirar a barba

Nany diz que “não dá para entender que um adolescente de 17, 18, 19 anos ponha o vestido, saia de barba com o cabelo comprido, entre no banheiro feminino e fale que é trans. Está sendo desrespeitoso com a própria palavra trans. Você é um cara, meu. Só está com vestido de chita e a pessoa se sente trans. Então trabalhe para isso, vá se transformar”.

Mas o que a geração de Nany People não viveu, foi a desconstrução do corpo trans, que não tem a obrigação de aquendar, de tirar a barba com laser, de colocar próteses de silicone nos peitos, tampouco de fazer cirurgia de redesignação, cirurgia esta que ela mesma sonhou em fazer um dia e só não a realizou por um pedido de sua mãe. Ela ainda usou uma famosa frase de Simone de Beauvoir sobre tornar-se mulher – justificando a transformação obrigatória para ser trans.

Lembremos que nada justifica transfobia, nem ter nascido nos anos 50 e 60, ser de outra geração, ou estar velho, porque exemplos como Rita Lee e Ney Matogrosso nos provam que é possível envelhecer mudando de opinião e acolhendo novas gerações e suas subjetividades de sexo e gênero. Mas Nany People se apoia nessa premissa de que “trabalha com linguagem” e não admite que “mutilem” a língua para agradar uma “minoria”.

Mas cara Nany, com todo respeito a seu talento e história, não é sobre agradar um grupo pequeno de pessoas, mas sobre elas se sentirem incluídas e acolhidas assim como tem sido por toda a comunidade cishetero. A diferença é que você vendeu sua subjetividade trans à essa sociedade que a ama e protege, mas continua matando pessoas trans que não atendem a essa norma limitante que você aceitou pra sua vida. E mesmo isso não anulando sua contribuição – ainda presente – na vida de todes, rever seu posicionamento é muito mais honesto que reiterar transfobia estrutural.

O que Nany People precisa é vencer o preconceito que carrega e continuar influenciando gerações de pessoas trans de forma transgressora e corajosa, sobretudo não sustentando mais a ideia de que transição está relacionada a um processo de mudança física, mas sim, a um sentimento de valor para além da estética que agrade o senso comum.

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