Visões sobre a nudez: Hugo Godinho estrela ensaio quente grupal inspirado em Caravaggio

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Já falamos aqui recentemente do ator Hugo Godinho e seu projeto 100 NUDE Shoots (of Hugo), onde propõe-se a posar sem roupa para 100 artistas diferentes (se não viu, não perca tempo). Gostamos tanto do projeto que resolvemos lançar, em primeira mão, o novo ensaio da coletânea aqui no Pheeno e, de quebra, bater um papo exclusivo com ele.

Para o novo trabalho, Hugo, que só havia posado sozinho ou com o próprio marido, Rodolfo Brunhari, convocou mais dois modelos, Rony Fernandes e Andre Labate, para serem clicados com eles pelo fotógrafo Chico Castro. O tema?! Cenas dramáticas inspiradas em Caravaggio e outros renascentistas. “O Chico sabia exatamente o que queria das nossas fotos”, conta o ator. “O quadro de amplitude bem limitada da fotografia forçou a nossa intimidade e os quatro corpos passaram a ocupar o mesmo lugar no espaço”. A sessão de fotos foi transmitida ao vivo através do Periscope do projeto.

Para o Pheeno, Hugo contou um pouco de sua intimidade com a nudez, curiosidades do projeto e respondeu algumas questões polêmicas sobre padrões estéticos e representatividade LGBT. Confira a entrevista abaixo e, logo em seguida, as fotos incríveis do ensaio:

O ator e performer Hugo Godinho
O ator e performer Hugo Godinho
Pheeno: Em seu site você conta que, devido à experiência de palco com a companhia de teatro Os Satyros, aprendeu a lidar com a nudez. Como foi o processo de se sentir confortável com atuar sem roupa diante do público?

Hugo Godinho: Os Satyros, aos quais tenho muito a agradecer, sempre forçaram o tratamento da nudez de forma natural. Digo “forçaram” porque na nossa sociedade machista e repressora (pra mim, machismo e repressão são praticamente sinônimos) a nudez sempre parece forçada, apesar de não haver nada mais natural! Racionalizando: forçado, portanto, é esse tabu em si. E é justamente por ser alvo e instrumento de repressão que a nudez, em cena ou em imagens, serve para contar tantas histórias sobre o mundo em que vivemos. Havendo entendido isso, nada mais natural que abraçar a causa-proposta e despir o pudor. Foi assim que eu propus no festival Satyrianas uma performance em que eu discutia abertamente com o público — estando completamente nu — os anseios, as vaidades e os receios que temos sobre nossos corpos, “como se fosse natural”. A partir de então, o pudor deixou de fazer qualquer sentido, e isso é extremamente empoderador!

Pheeno: Seu marido, Rodolfo Brunhari, participa de vários ensaios junto com você e o resultado é sempre incrível. Para ele foi fácil se acostumar com a nudez? Você o ajudou?

Hugo Godinho: O Rodolfo é na verdade um exibicionista de carteirinha (brincadeira), sempre esteve à minha frente em termos de se livrar do pudor. Na verdade, pra ele, ser reconhecido e até mesmo elogiado pela sua imagem e coragem em se expor é também uma questão de superação, por ter sido muito agredido na infância e adolescência justamente pela sua aparência. O primeiro ensaio nu que fiz, para o The Lonely Project, bem antes de lançar meu próprio projeto, foi incentivado por ele, que posou também, mas em um ensaio separado. Aprendi muito com ele e ele comigo, nesse processo. 100 NUDE Shoots foi uma iniciativa minha, mas tenho o apoio incondicional dele para tudo que invento fazer. Temos uma conexão muito forte e isso é mesmo muito notado por quem vê nossas fotos juntos.

Pheeno: Você sente alguma estranheza de posar sensualmente junto com outros modelos?! A química entre você e o Rodolfo nas fotos é única, você acredita que conseguiu ter essa conexão no ensaio coletivo?!

Hugo Godinho: Acho que quem vai poder julgar se houve química entre os quatro modelos no ensaio coletivo são vocês observadores. O que você acha? O processo foi bem descontraído, na verdade (vocês podem conferir na transmissão do making-of). Certamente a maturidade e profissionalismo dos quatro modelos e do fotógrafo contribuiu pra isso. Por outro lado, apesar do contato físico, não foi um ensaio que eu chamaria de sensual, pelo teor, e ninguém ali era marinheiro de primeira viagem, todos já tinham experiência em trabalhos semelhantes. Mas isso também não significa que não possa vir a trabalhar com pessoas sem experiência prévia, aliás, essa é uma ideia que tenho pra um futuro ensaio…

Pheeno: Ser fotografado por 100 artistas diferentes não é moleza! Você acredita que também deve haver uma certa “química” entre fotógrafo e modelo para o resultado fluir bem?

Hugo Godinho: Esse tema da conexão entre modelo e fotógrafo é um dos mais fascinantes pra mim. Na verdade, estou produzindo o décimo sexto ensaio, e posso dizer que não houve um que fosse igual a outro, nesse aspecto. É sempre uma relação nova, em diversos níveis. Mas dá pra dizer sim, que o ensaio flui melhor quando fotógrafo e modelo se entendem, de uma maneira ou de outra. Pode ser através da descontração, da discussão e do refinamento técnico, ou até mesmo de uma ligação sexualizada, porque é natural que a nudez traga isso, visto que esse vínculo do nu ao sexo já está impresso em todes nós. Alguns falam mais, dirigem mais o modelo, outros menos. Alguns sabem muito bem o que querem como resultado final, outros deixam mais a cargo do modelo. Essa experiência de descoberta do outro, pra mim, é uma das melhores partes desse trabalho, e é nítido quando o fotógrafo também se delicia com esse processo. Esses são os melhores ensaios, pra mim.

Pheeno: Já aconteceu alguma situação inusitada, engraçada ou constrangedora durante as sessões de fotos?

Hugo Godinho: Frequentemente. Durante o ensaio para o Projeto Chicos, fotografávamos na varanda de casa e os clientes do café na rua, embaixo, viram e começaram a provocar. O mesmo aconteceu durante um ensaio de madrugada sobre um viaduto de São Paulo. Um ônibus chegou a parar do nosso lado e as pessoas gritaram lá de dentro. Sei bem o quanto esse tipo de exposição ainda mexe com as pessoas, então tomo tanto os comentários divertidos quanto os agressivos como elogios, hahaha!

Pheeno: Você já foi criticado por ser um homem com corpo “padrão capa de revista”?! Na teoria, ter um corpo que se encaixa como padrão de beleza “aclamado” pela sociedade torna mais fácil a exposição. Como você responde essas questões?

Hugo Godinho: Já fui criticado diversas vezes por esse motivo. Se o fato de possuir um corpo socialmente “aclamado” — pra usar o seu termo — acaba por me ajudar a passar a minha mensagem pra um público maior, eu não preciso me abster de usar isso a favor do meu trabalho. Se a mensagem central do meu projeto não trata especificamente da desconstrução de padrões corporais, ela trata de outras questões artísticas e antropológicas das quais eu posso tratar, sem desmerecer nenhuma outra luta ou questão. Não é mesmo meu papel, por exemplo, protagonizar a discussão da problemática de uma minoria oprimida a qual eu não pertenço. Dito isso, me incomodaria muito reforçar qualquer estereótipo opressor, porque toda questão e luta libertária tem o meu apoio e meu apreço. Meu projeto está só começando e meu objetivo é levantar e espalhar cada vez mais as discussões associadas ao tema central, que é a nudez, porque a discussão em si é muito profícua. Sendo assim, eu já estou planejando e produzindo ensaios com participações especiais e que vão tocar em várias dessas questões, como por exemplo essa da padronização dos corpos.

Pheeno Representatividade LGBT é um assunto em alta. Os ensaios que vimos tem pegada homoerótica, o que, nem sempre, dialoga com bissexuais, lésbicas e transexuais. Pensando nisso, você definiu seu público alvo para atingir apenas homens gays ou tem planos de englobar as outras “siglas”? Em outras palavras, ensaios com pegada bissexual ou com mulheres ou homens trans estão nos seus planos?

Hugo Godinho: Eu sou um homem cis gay, então é natural e pertinente, para mim, que a homossexualidade transpareça nos meus trabalhos quando eles envolvem sexualidade. Na maioria dos ensaios até agora, não representei um personagem que não fosse eu mesmo. Mas assim como o projeto não visa expressamente a exaltar a beleza de um corpo padronizado (como falei na resposta à sua pergunta anterior), também não tem o intuito expresso de promover a temática homoafetiva. A depender da proposta de cada ensaio — que parte inicialmente de cada fotógrafo — eu venha a representar outros papeis e interagir com outros “personagens” do espectro LGBT ou mesmo heterossexual. É realmente um trabalho em contínua construção, e é interessante ver os caminhos que vai tomando. Com o nu sendo o único mote central, diversas questões adjacentes vão surgindo e se agregando como possibilidades, e isso é interessantíssimo pra mim.

Pheeno: Que conselho você dá para quem tem vontade de fazer um ensaio sensual nu, mas ainda não teve coragem?

Hugo Godinho: Pode ser clichê, mas: se joga! Muita gente me procura com essa mesma questão. Eu fico muito feliz de ver uma quantidade cada vez maior de fotógrafos trabalhando com a nudez e de pessoas querendo posar nuas, e posando! Tudo isso enriquece muito. Posso indicar diversos fotógrafos e projetos de nu, femininos ou masculinos, gays ou heteros, mais ou menos sensuais, de pegada comercial ou poética, de corpos padronizados ou que, felizmente, debochem de qualquer padrão. E pra quem teme a repercussão, posso afirmar: a crítica depreciativa e a não aceitação existem sim, mas a quantidade de admiração recebida é muitas vezes maior. A sensação final é sempre positiva ao nos enxergarmos despides dessa repressão sem sentido que nos acompanha desde que nascemos. E pra quem tiver interesse no meu projeto, peço que me acompanhem pelas redes. Em breve eu vou convocar bastante gente pra posar comigo em ensaios maiores, e pode ser o empurrão que faltava.

Confira o ensaio para o fotógrafo Chico Castro…

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Redação Pheeno

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